O objetivo da presente tese é contribuir para a reflexão sobre a poesia medieval. Isto é, sobre um género de poesia medieval portuguesa, as cantigas de amigo. Escritas por autores masculinos numa língua agora inexistente, galego-português, essas cantigas giram em torno das experiências do amor no tempo da Reconquista, na voz feminina. Nessa altura, enquanto os homens se afastavam de casa para lutar ao lado do rei, o lugar de autoridade paterna foi ocupado por uma mulher. Como uma reverberação desse fenómeno, as cantigas de amigo apresentam principalmente personagens femininas. O foco da nossa investigação são as cantigas da mãe e da filha estruturadas em forma de diálogo. Essa poesia retrata um mundo privado de autoridade masculina, mas ameaçado pelas expectativas que a sociedade medieval tinha para com as mulheres. O presente trabalho pretende analisar as características da poesia e as categorias ou os tipos e os subtipos das mães e das filhas nela presentes. Embora apresentados como sujeitos falantes nas cantigas, o que não era comum na maioria dos tratados históricos, legais e religiosos da época, os seus papéis são condicionados pelos deveres ligados à família e à sociedade. Uma vez que os padrões similares ocorrem nas tradições poéticas contemporâneas, as cantigas de amigo podem ser observadas como um ramo da reflexão artística de uma ideologia medieval na literatura propriamente dita.